A Escuridão Cria Confusão
Nasci em um vilarejo indiano que não tinha eletricidade. A maior parte das casas era coberta por telhados de palha que precisavam ser reparados todos os anos com palha nova e cordas trançadas de palha. Esse trabalho era normalmente executado no verão, durante os meses de abril e maio, quando muitas cobras costumavam aparecer devido ao intenso calor. Certa noite, após o pôr do sol, quando eu voltava para casa, vi uma cobra no caminho. Tomado pelo medo, gritei: “Cobra, cobra!”. Ao me ouvir, o ajudante da casa saiu com uma lâmpada na mão até o local onde eu estava. Com a luz da lâmpada, descobrimos que o que para mim parecia uma cobra era na verdade um pedaço de corda caído no meio da estrada.
No escuro, a corda parecia uma cobra, mas, assim que houve luz, a verdade foi revelada e o meu medo da cobra imediatamente desapareceu. Quando estava escuro, o meu coração batia acelerado e o meu corpo tremia, mas, com a luz, o meu medo se foi juntamente com a escuridão. De onde veio o meu medo? Qual foi a causa do meu medo? Sem dúvida, o meu medo provinha da ignorância. Ou seja, da escuridão, que me fez ver as coisas de forma distorcida. Se eu estivesse andando na estrada à luz do dia, teria visto as coisas de forma clara; não teria medo da corda de palha, que acabei confundindo com uma cobra.
Confusão, dúvida e medo aparecem quando não há luz suficiente. Quando há luz, você pode ver tudo com clareza. Por outro lado, quando está completamente escuro, você não pode ver nada. Por isso, se não é possível ver nada, não há nada para ser confundido, nada a temer. A confusão acontece na penumbra, quando é possível ver algo, mas sem clareza. No exemplo acima, duas coisas aconteceram causando o medo. Primeiro, a corda não pareceu ser aquilo que era e, como resultado, foi percebida incorretamente como uma cobra. Em nossas vidas, somos frequentemente tomados pelo medo porque não vemos as coisas como elas realmente são.
Assim, o primeiro erro que cometemos é não ter um correto entendimento da situação. O segundo é que projetamos a nossa imaginação no que vemos e apreendemos a situação de forma incorreta. Esses erros são corrigidos ao iluminarmos o material, assim como ocorreu com a corda: vista como cobra no escuro e percebida como uma simples corda na luz. A habilidade de ver os nossos erros é importante, porque somos os únicos capazes de corrigi-los. A luz de que precisamos é a luz do conhecimento, do amor e do entendimento, porque, com conhecimento, amor e entendimento, libertamos a nós mesmos das nossas ilusões e dos nossos medos. Só assim podemos viver livremente.
Embora possamos nos tornar mais fortes ao percebermos que uma corda não é uma cobra, o medo de cobras ainda permanece em nossa mente. Por não termos conhecimento da nossa verdadeira identidade e do propósito desta criação, projetamos a nós mesmos como algo diferente daquilo que realmente somos. Isso nos leva a ter um relacionamento diferente com o Criador e a criação, que, por sua vez, leva ao medo. Por exemplo, por que devemos ter medo de cobras? Tudo o que existe é criação de Deus, e mesmo as cobras têm sua beleza e um papel especial na criação. Esquecemos isso e somos tomados pelo medo das cobras pelo fato de muitas delas serem venenosas e porque podemos morrer se formos picados por elas. Esse medo pode nos consumir. Cobras venenosas e outras criaturas normalmente não atacam se não as perturbamos. Então, mesmo quando o medo de ser atacado possa ser compreensível, não é razoável assumir que sempre seremos atacados.
Havia um homem sagrado que vivia em um ashram em Brindavan e dividia o seu quarto com uma cobra. Numa noite escura de verão, ele se aproximou do pote para beber água. Quando ele tocou o pote, sentiu o corpo de uma cobra enrolado ao redor do recipiente. Ele disse calmamente: “Minha amiga, eu preciso beber um pouco de água”. A cobra se afastou. Quando ele terminou de beber, disse: “Minha amiga, eu terminei de beber a água, agora você pode voltar”. A cobra retornou para o pote de água. Ela permaneceu pacificamente com o homem por alguns dias, até que o dirigente do ashram entrou no quarto, viu que havia uma cobra lá e correu. Ao descobrir que o homem estava vivendo com uma cobra por muitos dias, o dirigente do ashram pediu que ele se mudasse para outro quarto.
Escuridão é ignorância e na escuridão não há existência. Ou seja, quando está completamente escuro não vemos nada e não estamos conscientes do que está à nossa volta. Por exemplo, se uma pessoa nunca viu ou ouviu falar sobre tigres e não conhece sua natureza, ela não sentirá medo ao ver um tigre. Se não existe conhecimento algum, não há motivo para temer.